Machado (eternamente) de Assis
No dia 07 de novembro último, foi realizada pelos alunos do 3º ano do ensino médio (noturno), no auditório do Colégio Estadual Pe. Mello, a culminância do Projeto de Literatura “Machado de Assis – Centenário de Morte”.
Fruto de um trabalho de pesquisa exaustivo, durante dois meses, os alunos fizeram uma bela e consistente apresentação, em que reuniram criatividade e conhecimento. Em trajes de gala, apresentaram a biografia do autor homenageado de forma lúdica; encenaram trecho da polêmica obra “Dom Casmurro”; declamaram; representaram o conto “Um Apólogo”; apresentaram um desfile com as principais personagens das obras mais conhecidas de Machado de Assis; e o desfecho foi com a declamação por uma aluna do famoso soneto “A Carolina”, que posteriormente foi cantado pelo aluno que magistralmente o musicou.
O Projeto de Literatura é desenvolvido todos os anos em nosso educandário com a finalidade de aplicar as competências e habilidades dos educandos, bem como interagir com sua família no dia da culminância, principalmente.
Machado (eternamente) de Assis - Edson Lobo Teixeira
Em tempos de “internetês” e de violência urbana – mais precisamente nos morros do Rio de Janeiro –, a importância de Machado de Assis um século depois de sua morte é pujante, uma vez que a sua vida e a sua obra servem de paradigma em qualquer época.
As competições do século XXI, a profusão de informações, os acelerados avanços tecnológicos e toda essa violência sem sentido nos impingem um inevitável estresse, quando não, uma funesta depressão. É aí que entram os livros de auto-ajuda – tão requisitados atualmente. Eles são para muitos a tábua de salvação (muitas das vezes inócuas!). Se lermos a biografia do moleque baleiro, que se tornou fundador e presidente perpétuo da Academia Brasileira de Letras, encontraremos um roteiro real que poderia ocasionar um desfecho infeliz: nasceu no morro, franzino e doentio; o pai era mulato, a mãe, portuguesa; ainda pequeno, perde a mãe; o pai casa-se novamente e, por felicidade, a madrasta era boa; logo depois morre o pai; Machado ficou sob os cuidados da madrasta e para sobrevivência vendia balas e doces na porta dos colégios que não podia freqüentar.
Todavia, o menino do morro, com seus parcos conhecimentos adquiridos numa escolinha da redondeza, conseguiu, com muito esforço e ajuda de terceiros, uma vasta cultura de causar inveja a qualquer membro das famílias abastadas. Foi um autodidata! Fez de tudo na vida: de operário de gráfica a escriturário de repartição pública. Casou-se com a mulher amada – Carolina.
Sua vida iniciou-se à margem da sociedade, entretanto não se tornou um marginal. Conquistou o respeito e o prestígio social. Foi um homem completo... Ou quase: “Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado de nossa miséria” – é o lamentável desabafo de Brás Cubas (ou de seu criador?), ao encerrar suas memórias.
No âmbito cultural, a obra machadiana permanece até hoje devido ao seu sublime talento na arte da palavra, o que originou a criação de uma galeria de personagens que fascinam e instigam todas as gerações.
A sua genialidade é refletida no seu estilo próprio, que o transformou no melhor prosador de nossas letras. A criação do romance psicológico, por exemplo, proporcionou ao leitor acompanhar o amadurecimento da personagem ao longo da narrativa, ficando esta para o segundo plano. Privilegiou o mundo interior sobre o exterior. Foi um adeus à linearidade do enredo, muito a gosto dos românticos.
A expressão machadiana é sóbria. Não usa o registro oral, usa o registro formal, uma linguagem escorreita, no padrão formal, embora preserve a simplicidade na riqueza da linguagem. É conveniente que qualquer escritor incipiente ou não leia Machado de Assis a fim de que possa conhecer um rico universo literário, que revolucionou uma época e ainda se conserva cativante, pois continua suscitando debates reflexivos e polêmicos como a traição (?) de Capitu, em Dom Casmurro.
O autor de Quincas Borba foi ambíguo, irônico, sutil e se utilizou do humor negro para fazer refletir em vez de rir. Perito em tecer histórias que galgam o tempo, foi autor múltiplo, inventivo e original, um verdadeiro bruxo, como carinhosamente fora chamado por Carlos Drummond de Andrade. Um bruxo beletrista que jamais cairá no oblívio!
Machado (eternamente) de Assis porque a sua trajetória de vida e literária transcende as eras. Peculiaridades de gênio! Por conseguinte, corroboram as palavras do crítico e historiador francês Gustave Lanson: “O gênio é sempre de seu século, mas sempre o ultrapassa; os medíocres são inteiramente de seu século, estão sempre na temperatura de seu meio, no nível de seu público”.